Mais um dia no acolhimento

Qualquer trabalhador que se submete dentro de uma Unidade, ou como referência técnica já entendeu seu limite. Às vezes, se admira ao demonstrar um pouco mais de calma em situações graves e conflitantes. Mas, por muitas vezes, tomba, cai, desmonta e, sem mais uma palavra que explique o contexto, ou que traga um pouco de paz, chora. Chora um choro sentido, lágrimas dolorosas, por não saber agir, por não ter o que fazer, e por se deparar com uma dor tão grande em um ser tão jovem, tão sem expectativa, tão sem esperança…

É o receio de ser mais uma vez deixada num abrigo. É o temor de não ser amada! Por não ter nenhum familiar que lute por sua vida, por seu futuro, por seu direito de conviver em família.

A infância foi recheada de tios, tias, maus ou bons. Foi permeada de resoluções, determinações judiciais, destituída de família e de alma.

Dos irmãos, alguns foram enterrados, perfurados como peneira, outros se encontram privados de liberdade. Os pais no uso abusivo de substâncias que os fazem sentirem-se bem. Nem que seja por um instante.

Mas, agora, a refeição dos acolhidos teve briga, confusão, ameaças e agressões físicas. O almoço não desceu. O bebê chorou, o cachorro latiu, e a polícia chegou.

Mais uma vez. Outra vez.

Acolhimento

O dia se finda. O sol se põe. Ela volta pra casa, olhos inchados de chorar, corpo doendo de se contorcer na maca, na tentativa de se desvencilhar das faixas que a continham. 

Mais um pedido de perdão: “Vocês me aceitam de volta? Eu dou muito trabalho pra vocês”. E nós choramos na volta pra nossa família, pro aconchego do nosso lar, onde nossos filhos não têm medo do futuro, brincam despretensiosamente… Nos calamos diante de tanta complexidade, diante de nossa incompetência, diante da impossibilidade de salvar alguém, de mudar história, e diante da dor que nos atravessa a alma e consome um pouco de cada um de nós todos os dias.

É a nossa realidade. Mudar o imutável, alterar o curso de um rio incontrolável, e demonstrar afeto, limite e esperança, com toda a incoerência e complexidade que a própria realidade apresenta.

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